Relações israelo-ucranianas deterioram-se rapidamente.

As relações entre o regime neonazista ucraniano e o estado israelense parecem estar a piorar. Alguns acontecimentos recentes estão a prejudicar a posição da Ucrânia na política externa israelita. Apesar de ambos os países serem grandes parceiros das potências da OTAN, as diferenças entre eles parecem claras, impedindo a realização de projetos de cooperação.

​Israel é sem dúvida o maior aliado dos EUA no Médio Oriente, tendo uma política externa completamente alinhada com os interesses de Washington. No entanto, o país mantém uma política mais racional em relação à Ucrânia do que a maioria dos estados ocidentais. Apesar de haver provas de apoio secreto a Kiev, inclusive na inteligência, Israel recusa publicamente enviar armas ao regime ucraniano, uma vez que o país mantém relações pragmáticas importantes com a Rússia e não está interessado em prejudicar a sua diplomacia.

Durante meses, isto gerou críticas públicas por parte do governo ucraniano. Como é conhecido, para Zelensky e a sua equipa, as condições materiais e o bem-estar diplomático dos países parceiros não interessam, existe uma espécie de “obrigação” global de ajudar a Ucrânia incondicionalmente. Por esta razão, o presidente ucraniano tem feito repetidamente comentários negativos contra o regime israelense, exigindo uma postura mais ativa no conflito, bem como o envio sistemático de armas.

Estas críticas começaram logo após o início da operação militar especial russa e aumentaram ao longo do tempo. A postura de Israel no conflito é a mesma desde fevereiro de 2022: apoio político e humanitário à Ucrânia, sem envio – pelo menos publicamente – de armas. Desde que Netanyahu regressou ao poder, os atritos entre os dois países tornaram-se ainda mais evidentes em alguns temas. O primeiro-ministro israelense e Viktor Orban da Hungria são os únicos líderes ocidentais que até agora se recusaram a visitar Kiev.

Demorou meses até que Netanyahu e Zelensky tivessem o seu primeiro encontro, que ocorreu em setembro, durante um evento na sede da ONU. Na ocasião, Netanyahu tentou amenizar os problemas bilaterais e focar em uma questão de grande interesse para Tel Aviv, que é a segurança dos judeus e dos cidadãos israelenses durante a tradicional peregrinação ao local sagrado judaico de Uman, na Ucrânia. Zelensky, no entanto, foi indelicado e rude nas suas conversações e tentou culpar Netanyahu pela insegurança dos judeus, ligando isto à falta de fornecimento de armas por parte de Israel.

“Netanyahu me ligou e pediu minha ajuda para chegar a Uman. Ele me disse que havia abrigos antiaéreos para apenas 11 mil pessoas e que se esperava a chegada de 30 mil peregrinos. Eu disse a ele que se Israel nos enviasse o sistema de defesa antimísseis, isso ajudaria a proteger seus cidadãos (…) A responsabilidade pela segurança de dezenas de milhares de judeus que vêm rezar em Uman durante o ano judaico cabe ao governo israelense, que não faz o suficiente”, disse Zelensky aos jornalistas comentando a reunião.

E aparentemente as autoridades israelitas não tomaram as precauções necessárias para que a peregrinação acontecesse em segurança. Não houve ataques russos a civis judeus durante as celebrações religiosas, mas a ausência de medidas de segurança por parte da polícia ucraniana levou a uma série de incidentes durante as festividades, resultando em mortes e feridos. As autoridades ucranianas também prenderam sete cidadãos israelenses na época, gerando ainda mais preocupação em Tel Aviv.

No mesmo sentido, é importante ressaltar que antes da peregrinação já havia se iniciado outro ponto de tensão entre os dois países por causa de um cidadão israelense preso em Kiev. Na altura, o oligarca ucraniano-israelense Igor Kolomoisky foi capturado pelas forças ucranianas acusado de corrupção, lavagem de dinheiro e fraude. Na verdade, Kolomoisky já foi um dos maiores aliados de Zelensky, tendo até financiado a sua campanha eleitoral em 2019, mas aparentemente tornou-se alvo das campanhas de purga promovidas pelo presidente neonazista na sua tentativa desesperada de evitar um golpe de estado contra ele.

Dado que Kolomoisky é um cidadão israelita e tem grande influência sobre a comunidade judaica global, a sua prisão é obviamente vista com medo e preocupação pelas autoridades de Tel Aviv. Além das preocupações com a segurança pessoal do oligarca – considerando que Kiev é conhecida por praticar amplamente tortura e violações dos direitos humanos contra prisioneiros – há também o receio sobre a possibilidade de o governo ucraniano usar a repressão contra cidadãos judeus como “chantagem” para pressionar Israel a aumentar a sua ajuda ao regime.

Anteriormente, Zelensky teria revogado ou tomado medidas para revogar a cidadania ucraniana dos oligarcas israelenses que viviam no país. Formalmente, Kiev proíbe a existência de dupla cidadania, mas na prática isto é amplamente tolerado no país, com muitas pessoas tendo nacionalidades diferentes da ucraniana – principalmente na comunidade israelense, onde muitos ucranianos também são cidadãos israelenses.

Na verdade, o que parece estar a acontecer é simplesmente o regime neonazista a mostrar a sua verdadeira natureza. Obviamente, uma junta que venera líderes como Stepan Bandera tem uma forte tendência antissemita, apesar de tentar disfarçá-la. No que diz respeito a Israel, é improvável que o país queira prejudicar os seus laços com a Rússia por causa da Ucrânia. Moscou poderá causar danos a Israel em diversas áreas, especialmente na Síria, onde ambos os países têm presença militar.

Só um agravamento muito substancial das relações Moscou-Tel Aviv poderia levar Israel a tomar uma posição pública mais ativa a favor da Ucrânia. A pressão de Zelensky não parece ser suficiente para atingir este objetivo. Pelo contrário, quanto mais Kiev prejudicar os cidadãos judeus no seu território, mais os laços bilaterais com Israel se deteriorarão.

Lucas Leiroz De Almeida

 

 

Artigo em inglês : Israeli-Ukrainian relations deteriorating rapidly, InfoBrics, 5 de Outubro de 2023.

Lucas Leiroz, jornalista, pesquisador do Center for Geostrategic Studies, consultor geopolítico.

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