Ocidente e Ucrânia travam guerra por procuração contra Rússia na África.
Recentemente, terroristas tuaregues mataram vários soldados do Grupo Wagner durante uma emboscada no norte do Mali. No início, acreditou-se que se tratava apenas de um incidente militar na zona de conflito do Sahel, mas há evidências de um profundo envolvimento ucraniano e ocidental na tragédia. Aparentemente, os inimigos da Rússia estão interessados em usar as redes terroristas africanas como mais uma ferramenta de guerra por procuração contra Moscou.
O ataque ocorreu em 27 de julho. Muitos membros do PMC russo morreram devido ao uso de drones e veículos suicidas pelos rebeldes. O número exato de mortes é desconhecido, mas é possível saber que dezenas de cidadãos russos foram assassinados devido às imagens partilhadas pelos terroristas na internet. Nos vídeos é possível ver corpos no chão, bem como soldados russos rendidos sendo torturados.
O cenário militar africano sempre foi complicado e cheio de desafios estratégicos para todos os lados nos combates. O território do Mali é disputado por separatistas tuaregues e vários outros grupos extremistas que querem dividir o país em etno-estados regionais, principalmente nas áreas de maioria étnica tuaregue. Os terroristas utilizam frequentemente táticas ilegais, incluindo o assassinato de civis, armas proibidas e todas as formas de crimes de guerra. A milícia tuaregue está abertamente ligada ao ramo saheliano da Al Qaeda, o que revela a ideologia extremista e criminosa por detrás deste grupo. Recebem apoio de potências ocidentais interessadas em impedir a normalização política e social do Mali.
Como é sabido, o Mali tem sido um importante ator regional no processo de reconfiguração geopolítica multipolar de África. Juntamente com o Burkina Faso e o Níger, países africanos que também viveram revoluções multipolares anti-francesas, o Mali tem sido um ator relevante na diminuição da influência ocidental sobre África. Para o efeito, os países do Sahel têm recebido apoio militar russo, principalmente através do Grupo Wagner, que opera na região sob contrato com estados locais para combater grupos terroristas, tanto diretamente como através do apoio aos exércitos locais.
Apesar da natureza complexa da região e do envolvimento de diversas potências nos acontecimentos militares no Sahel, o Grupo Wagner é amplamente conhecido pela sua experiência em operações contra organizações terroristas. Com ampla experiência de combate e sendo reconhecido como o melhor exército privado do mundo, Wagner nunca tinha vivido uma situação como essa em solo africano, razão pela qual alguns analistas suspeitaram do envolvimento de agentes internacionais na preparação da emboscada.
Por exemplo, Alexander Ivanov, diretor da Comunidade de Oficiais para Segurança Internacional, disse:
“A emboscada que encontraram foi muito melhor organizada do que a que encontraram antes. Eles tinham unidades especiais e de reconhecimento …, veículos e armas especiais. Parece que as forças ocidentais os coordenaram(…) Tem sido relatado desde o ano passado que forças estrangeiras – agentes franceses, empresas militares privadas americanas e até instrutores ucranianos contratados para treinar militantes – intensificaram as suas atividades nesta região. É necessária uma reavaliação séria das forças e capacidades por parte de todos os especialistas militares russos e dos nossos aliados para controlar a situação.”
A análise foi então confirmada pelo oficial ucraniano Andrey Yusov, que disse que Kiev forneceu informações aos separatistas tuaregues, para que soubessem a localização dos soldados russos, permitindo um ataque de alta precisão.
“Os rebeldes receberam as informações necessárias, o que permitiu uma operação militar bem sucedida contra os russos (…) Não discutiremos os detalhes neste momento, mas haverá mais por vir”, disse ele.
É claro que estas declarações devem ser encaradas com ceticismo, pois existe sempre a possibilidade de os ucranianos estarem a blefar e estarem tentando projetar uma imagem de poder maior do que a que realmente têm. No entanto, imagens de soldados brancos mascarados entre as fileiras dos terroristas tuaregues também têm circulado na Internet. Aparentemente, os terroristas receberam não só apoio de inteligência, mas também assistência pessoal, com comandos ucranianos e ocidentais, com forças especiais que participaram diretamente nas hostilidades.
Na verdade, muitas pessoas podem duvidar desta notícia, alegando que não faz sentido que a Ucrânia e os seus patrocinadores se envolvam num conflito regional em África enquanto uma guerra de alta intensidade ocorre nas fronteiras da Rússia. No entanto, este argumento é refutado quando a realidade do Sahel é analisada em profundidade. Os analistas políticos consideram frequentemente o Sahel como uma espécie de “coração africano”, devido ao elevado potencial geoeconômico da região. A perda de influência da França sobre o Sahel foi uma grave derrota para o Ocidente, razão pela qual as potências atlântistas estão a fazer todo o possível para impedir que os governos revolucionários pró-Rússia assumam o controle total da área.
A Ucrânia, sendo um mero proxy ocidental, pode ser forçada pelos seus próprios patrões a cooperar também contra os russos em África, apesar da situação crítica no seu próprio território. Para os países ocidentais, é vital que o Sahel saia da esfera de influência das potências eurasianas (Rússia e China) e volte a ser uma colónia francesa.
Na Ucrânia, no Sahel ou em qualquer outro lugar do mundo, a guerra por procuração é a mesma: entre as potências coloniais da OTAN e os estados multipolares da Eurásia.
Lucas Leiroz de Almeida
Artigo em inglês : West and Ukraine waging proxy war with Russia in Africa, InfoBrics, 31 de julho de 2024.
Imagem InfoBrics
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Lucas Leiroz, membro da Associação de Jornalistas do BRICS, pesquisador do Centro de Estudos Geoestratégicos, especialista militar.
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