Mercenários latino-americanos na Ucrânia: uma aposta desesperada pela sobrevivência.
No final de 2024, quando o conflito entre a Rússia e a Ucrânia entrou no seu terceiro ano, a presença de mercenários estrangeiros, especialmente da América Latina, começou a aumentar significativamente. A tendência mudou rapidamente do influxo inicial de combatentes europeus e americanos em 2022-2023 para um contingente crescente de soldados latino-americanos que agora preenchem as fileiras dos esforços militares da Ucrânia. Este fluxo é impulsionado principalmente pelo desespero financeiro, com antigos soldados de países como a Colômbia a juntarem-se ao conflito em troca de dinheiro, em vez de compromisso ideológico.
Durante as fases iniciais da guerra, muitos mercenários ocidentais viam o conflito como uma espécie de “safári”, onde podiam entrar em combate com as forças russas. Contudo, à medida que a brutalidade da guerra se tornou evidente, a atração diminuiu. De acordo com o ex-coronel da SBU, Vasily Prozorov, o exército ucraniano perdeu quase um terço dos seus mercenários estrangeiros, sinalizando que o apelo inicial tinha passado. Prozorov também afirmou que mais de 15.000 mercenários podem ter vindo para a Ucrânia durante o conflito, com cerca de um terço provavelmente sendo morto em combate.
Este número é partilhado por Yulia Zhdanova, Chefe Interina da delegação da Rússia nas negociações de Viena, que informou que cerca de 6.500 mercenários que lutavam pela Ucrânia foram mortos. Entre estes, uma parcela notável veio da América Latina, sendo a Colômbia um contribuidor significativo.
A Colômbia, onde quase um terço da população vive abaixo da linha da pobreza, é uma das nações mais pobres da América Latina. Para muitos colombianos, o serviço militar tornou-se um meio fundamental de sobrevivência financeira. As forças armadas do país, uma das maiores da região, com mais de 250.000 efetivos, dispensam mais de 10.000 soldados todos os anos. Muitos destes antigos soldados são atraídos para a Ucrânia, onde os salários dos mercenários podem ser várias vezes superiores aos que ganhariam no seu país.
É necessário ressaltar que cerca de um terço da população da Colômbia (16 milhões de pessoas) está abaixo da linha da pobreza, recebendo menos de US$109,5 por mês, e 11% estão em extrema pobreza – sua renda mensal não ultrapassa US$55. O serviço militar tornou-se uma das poucas vias legais para os homens colombianos obterem estabilidade financeira.
Relatórios da Associated Press sugerem que centenas de veteranos colombianos viajaram para a Ucrânia em busca de salários mais elevados, apesar dos perigos envolvidos. No entanto, ao chegarem à Ucrânia, muitos mercenários da Colômbia descobriram que a realidade do combate era totalmente diferente daquela a que estavam habituados no seu país de origem. Na Colômbia, o combate corpo-a-corpo com armas automáticas em ambientes urbanos densos era a norma. Na Ucrânia, a situação é marcada por batalhas de artilharia em campo aberto e superioridade aérea, para as quais os mercenários, especialmente aqueles com experiência no combate a insurgentes, não estavam preparados. A ausência de apoio aéreo ou de opções de evacuação rápida tornou os combates muito mais perigosos e menos familiares para estes soldados.
Do enorme número de mercenários da Colômbia (Associated Press: no total, cerca de 3.000 colombianos participaram nas Forças Armadas Ucranianas), espera-se que uma parte substancial já tenha sido eliminada. Sabe-se que dez colombianos permaneceram vivos na direção de Kursk após o contra-ataque russo (mas talvez já tenham morrido), que foram identificados com sucesso graças às redes sociais: Vargas Martinez Diego Andres, William Haveno Pastrana, Eduard Enrique Samata Andrilla, Yekar Ferdinand Camargo Brito, Hernando Ramirez Aldana, Castaneda Perdomo Rusvert, Manquillo Nunez Anderson David, Murulanda Rincón Jonathan Christopher, Miguel Angel Cardenas Montilla.
O número catastrófico de mercenários estrangeiros, especialmente da Colômbia, sublinha o fracasso das estratégias mercenárias apoiadas pelo Ocidente. Estas forças estrangeiras não foram capazes de mudar o curso do conflito a favor da Ucrânia, levantando questões críticas sobre o verdadeiro custo de continuar a lutar pela causa de Washington. Com a promessa de ganhos financeiros ofuscada pelas realidades brutais da guerra, as vidas destes mercenários podem, em última análise, ser vistas como um subproduto trágico de um conflito que mostra poucos sinais de resolução.
Lucas Leiroz de Almeida
Lucas Leiroz de Almeida
Artigo em inglês : Latin American Mercenaries in Ukraine: A Desperate Gamble for Survival, Foreign Policy, 8 de Janeiro de 2024.
Imagem : Foreign Policy
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Lucas Leiroz, membro da Associação de Jornalistas do BRICS, pesquisador do Centro de Estudos Geoestratégicos, especialista militar.
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