Extradição de Assange Seria Ilegal, ‘Jornalista Fazendo Seu Trabalho’: John Kiriakou

Enquanto se acredita que o Equador extradite Assange aos EUA, John Kiriakou, “denunciante relutante” considerado o primeiro oficial de inteligência dos EUA a revelar informações sobre o uso de técnicas de tortura pela comunidade de inteligência norte-americana, comenta o caso envolvendo o fundador de WikiLeaks na seguinte conversa com o renomado jornalista Edu Montesanti.

“A única coisa que pode salvar Julian Assange é a anulação do júri”, diz o denunciante (whistleblower) John Kiriakou, ex-oficial de contraterrorismo da CIA e ex-investigador chefe do Comitê de Relações Exteriores do Senado norte-americano residente no estado da Virgínia, em entrevista exclusiva a este repórter.

O Departamento de Justiça dos EUA está agindo nos bastidores para que Assange seja extraditado da Embaixada do Equador em Londres, e processado em solo estadunidense. As acusações criminais contra o fundador de WikiLeaks foram acidentalmente reveladas no início de novembro, quando o nome de Assange foi encontrado no processo judicial de um caso não relacionado ao seu, sugerindo que os promotores haviam copiado um texto clichê e se esqueceram de mudar o nome do réu.

O procurador-assistente Kellen S. Dwyer, instando um juiz a manter a questão lacrada, escreveu que “devido à sofisticação do réu e à publicidade em torno do caso, nenhum outro procedimento é susceptível a não ser manter confidencial por qual fato Assange foi acusado. Mais tarde, Dwyer escreveu que as acusações “precisariam permanecer seladas até que Assange fosse preso”.

É muito provável que o jornalista australiano, que em março de 2017 divulgou um arquivo de documentos detalhando as operações de hacking da C.I.A. conhecidas como Vazamento Vault 7, esteja sendo acusado pelos promotores norte-americanos de violar a Lei de Espionagem de 1917.

O engenheiro Joshua A. Schulte, 29, de Nova Iorque, é o principal suspeito de fornecer ao WikiLeaks os documentos que revelam as sensíveis ferramentas de espionagem eletrônica massiva da CIA em todo o mundo, é acusado pelos promotores de violar repetidas vezes a Lei de Espionagem.

“Tecnicamente, a anulação do júri é ilegal. Dá-se quando um júri absolve não porque o réu é inocente, mas porque a lei está errada. A Lei de Espionagem está errada. Julian Assange é jornalista. Ele nunca deveria ter sido acusado de nenhum crime, em primeiro lugar”, diz Kiriakou, a primeira autoridade dos EUA que discursou, em dezembro de 2007, contra o programa de tortura de George Bush e permaneceu 30 meses de prisão por causa disso, de 2013 a 2015.

A União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, na sigla em inglês) também qualifica a Lei de Espionagem de “uma lei fundamentalmente injusta e inconstitucional”. Kiriakou lembra que tem argumentado, ao longo dos anos, que “a Lei de Espionagem é tão ampla a ponto de ser inconstitucional, embora não tenha sido contestada pelo Supremo Tribunal”.

‘Investigando a MIM!?’

“Um oficial graduado da C.I.A. no Centro de Contraterrorismo me perguntou se eu queria ser ‘treinado para o uso de técnicas avançadas de interrogatório’, Eu neguei. Disse que tinha um problema moral e ético com tortura e que, apesar do julgamento do Departamento de Justiça, considerava-o ilegal”, relatou Kiriakou em março passado ao jornal The Washington Post.

Autor de três livros, Kiriakou foi um dos protagonistas do documentário de James Spione, intitulado Silenced, no qual o ex-agente da C.I.A. informou-se ao lembrar que depois de suas denúncias, “percebi que eles estão investigando a MIM!?”. O caso de John e de Assange possuem semelhanças não apenas por causar reação a favor de ambos por parte de pessoas que representam uma reserva moral em todo o mundo.

A “democracia profundamente fracassada dos EUA”, segundo palavras de Kiriakou a este repórter em outubo de 2016, está mais uma vez agindo contra a liberdade de expressão e a justiça, pilares de uma verdadeira democracia. Na mais absoluta contraposição aos crimes estatais que ambos revelam, duramente condenados pelo mesmo Estado usurpador do poder.

Enquanto as revelações de Kiriakou – não ecoadas suficientemente pela grande mídia – não mudaram nada na “política” dos EUA, dentro e fora do país enquanto o regime de Washington continua cometendo hediondos crimes de guerra, contra a humanidade e contra a própria Constituição dos EUA – sob silêncio midiático enurdecedor – os criminosos denunciados por Assange pretendem processá-lo: em nome da democracia e da justiça.

Em seu primeiro discurso público como diretor da CIA no início do ano passado, Mike Pompeo criticou WikiLeaks, qualificando-o de “um serviço de inteligência não estatal hostil”, acrescentando que “não podemos mais permitir que Assange e seus colegas utilizem os valores da liberdade de expressão contra nós. Usar valores de liberdade de expressão contra nós”?

Portanto, mais uma vez está claro que, aos donos do poder estadunidense, há um limite para a uitilização da Primeira Emenda da Constituição local que garante liberdade de expressão, e para a democracia como um todo; o dispositivo constitucional, que faz os “falcões” baterem no peito e se vangloriar de possuírem a democracia mais avançada do planeta, é válido apenas enquanto não contrariar os interesses do establishment local.

Nenhum ato de espionagem

Kiriakou prevê que o governo dos EUA argumentará que Assange fez exatamente o que a Lei de Espionagem de 1917 descreve como espionagem, isto é, “fornecer informações de defesa nacional a qualquer pessoa que não tenha o direito de recebê-la”.

O denunciante norte-americano observa que “a questão aqui, altamente incomum, sem precedentes mesmo para um cidadão estrangeiro, e Assange é australiano, é ser acusado de espionagem tendo em vista que ele não roubou informação. Assange simplesmente recebeu informação, a qual ele posteriormente, tornou pública”. Kiriakou aponta que Assange alega que se trata apenas de um jornalista fazendo seu trabalho: “Nenhum governo jamais acusou um jornalista de espionagem por fazer seu trabalho”.

Jesselyn Radack, diretora do Programa de Proteção ao Informante e à Fonte e uma das advogadas de Kiriakou, escreveu em um editorial de 2014 intitulado : “Os argumentos da Primeira Emenda fracassaram, em grande parte porque criminalizariam o jornalismo feito possível pelos vazamentos. O motivo e a intenção do denunciante são irrelevantes. E não há defesa do denunciante, o que significa que o valor público do material divulgado não importa, absolutamente”.

Despotismo no Judiciário dos EUA

Outro sério obstáculo que Assange enfrentaria é a juíza Leonie Brinkema, de acordo com o ex-agente da C.I.A. Brinkema lidou com seu caso, assim como o da outra ex-agente da C.I.A. e denunciante, Jeffrey Sterling, além de também reservar o caso de Edward Snowden para si. “Brinkema é uma juíza de enforcamento”, lamenta Kiriakou.

“Brinkema não me deu, literalmente, nenhuma chance de defesa. Em determinado momento, enquanto se aproximava o julgamento, meus advogados fizeram 70 moções pedindo que 70 documentos classificados fossem desclassificados, para que eu pudesse usá-los para me defender. Eu não tinha defesa sem eles. Ficamos três dias parados para as audiências. Quando chegamos ao tribunal, Brinkema disse: “Deixem-me economizar bastante o tempo de todo mundo: nego todas estas 70 moções. Você não precisa que nenhuma dessas informações seja desclassificada”. Todo o processo levou um minuto. Ao sair do tribunal, perguntei ao meu advogado-chefe o que acabara de acontecer. “Acabamos de perder o caso. Foi o que aconteceu”.

Ele lembra o triste final daquele julgamento quando, em 2013, Brinkema disse-lhe, com o dedo em riste, que se levantasse, e disse: “Senhor Kiriakou, odeio esse apelo. Se pudesse, o condenaria por dez anos”. John Kiriakou classifica seus comentários como“ inapropriados, mas essa é Brinkema”.

Guerra Declarada dos EUA contra a Humanidade

Barry J. Pollack, um dos advogados de Assange, disse assim que o nome do fundador de WikiLeaks foi encontrado no processo judicial de um caso não relacionado, mencionado mais acima:

“O governo que impõe uma acusação criminal a alguém por publicar informações verídicas, trilha um caminho perigoso para uma democracia. A única coisa mais irresponsável que acusar uma pessoa de publicar informações verdadeiras, seria colocar uma informação pública que claramente não se destinava ao público e sem qualquer aviso ao senhor Assange. Obviamente, não tenho idéia se ele foi realmente acusado nem pelo quê, mas a noção de que as acusações criminais federais podem ser impostas com base na publicação de informações verdadeiras, é um precedente incrivelmente perigoso”.

O Procurador Geral dos EUA, Jeff Sessions, disse que processar Assange é “prioridade” para ele. Há alguns no Ocidente plenamente convencidos de que Assange merece ser julgado e posto na cadeia por “ameaçar” a segurança nacional dos EUA, e “minar” seus chamados processos democráticos – o sistema que Assange mesmo, amarga ironia, provou ser uma mentira total. A ex-candidata presidencial americana Hillary Clinton e o ex-vice-presidente Joe Biden o chamaram de “terrorista”, mas a realidade é que o trabalho de Assange, fornecendo informações de alto interesse público, atua como antídoto revolucionário contra notícias falsas e a sombria política global, especialmente a estadunidense que é servida pelo povo, ao invés de servir ao povo.

Tudo isso, enquanto as amargas verdades que Assange traz à luz enviam uma mensagem clara de que a chamada democracia ocidental deve ser submetida a um processo de transparência radical. WikiLeaks não deixa duvidas, Valt 7 como mais recente exemplo, de que os serviços de inteligência em todo o mundo, a começar pela terrorista C.I.A., devem ser brecados – como desejava o presidente John Kennedy – enquanto ferramentas não democráticas destinadas a preservar o poder de uma minoria.

De acordo com o advogado norte-americano e defensor das liberdades civis Ben Wizner da ACLU: “Qualquer processo contra Assange pelas publicações de WikiLeaks não teria precedentes e inconstitucional, e abriria as portas para investigações criminais de outras organizações de notícias”.

grande mídia também deve ser culpada no caso de uma condenação de Julian Assange, e por essa distorção total de cenários já que não só nunca pressionou minimamente esses criminosos do regime de Washington que invadem smartphones, computadores e televisões conectadas à Internet em qualquer lugar do mundo – e ainda fazem parecer que os hacks eram praticados por outro serviço de inteligência.

Quem julga a CIA? Quem protege as pessoas de serem hackeadas? Outra amarga ironia nisso tudo, é que uma provável condenação de Assange porá em perigo os próprios fundamentos da imprensa livre, imprensa especialmente ocidental que afirma ser livre mas que nunca deu a Assange a atenção que seu trabalho merece, longe disso – enquanto a inação da mídia fala por si mesma, o jornalista australiano também tem provado por todos estes anos, que a mídia corporativa não é livre.

A tempo: alguma semelhança, na forma de lidar com as leis e no comportamento arrogante, entre os juízes e promotores de la e um “certo” juiz de terras tupiniquins, que escandaliza o mundo por ferir os princípios legais mais básicos? Pois WikiLeaks tambem já provou, documentalmente como sempre faz, que o juizeco Serginho Moro e toda a patota da cúpula do Poder Judiciário e Ministério Público tupiniquim, fez cursinhos jurídicos secretos nos Estados Unidos – com tudo pago.

Que seríamos de nós, em que mundo viveriamos se não fosse WikiLeaks?

Edu Montesanti


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