2010, o ano da contracção económica severa
Os relatos optimistas nos media financeiros desvirtuam os efeitos da contracção de crédito agora em curso. As injecções maciças de liquidez dos bancos centrais impediram o colapso de mercados financeiros, mas pouco fizeram para facilitar o desalavancamento das famílias ou estimular actividade na generalidade da economia. A crise despojou US$13 milhões de milhões (trillion) do valor das acções detidas pelas famílias trabalhadoras, as quais agora deparam-se com o seu acesso ao crédito cortado ou gravemente restringido pelos mesmos bancos que receberam enormes salvamentos financiados pelos contribuintes. O estrangulamento fiscal das milhões de pessoas que deixaram de ser consideradas “com capacidade creditícia” está progressivamente a enfraquecer a procura e a espalhar o pessimismo através de todos os níveis de rendimento. O crescente desespero público foi o centro de uma reportagem especial de fim-de-semana da Bllomberg News.
“Os americanos têm-se tornado mais sombrios tanto acerca da economia como do rumo do país ao longo dos últimos três meses, mesmo quando os EUA mostram sinais de mudança da recessão para a recuperação. Quase a metade das pessoas sente-se agora menos financeiramente segura do que quando o presidente Barack Obama tomou posse em Janeiro, revela um inquérito nacional da Bloomberg”.
A economia é a preocupação prioritária do país, sendo o desemprego persistentemente elevado a maior ameaça que o público vê. Oito em cada 10 americanos vêem a taxa de desemprego como um alto risco para a economia nos próximos dois anos, superando o défice do orçamento federal, o qual é mencionado por 7 em cada 10. Um aumento de impostos é mencionado como um alto risco por quase 6 em cada 10.
Menos de 1 em cada 3 americanos pensa que a economia irá melhorar nos próximos seis meses… Apenas 32 por cento dos que responderam ao inquérito acreditam que o país está a caminhar na direcção certa, abaixo dos 40 por cento que disseram isso em Setembro”. (Bloomberg)
O quase delírio de optimismo que se seguiu à eleição presidencial de 2008 desvaneceu-se em menos de 12 meses. Se bem que as políticas da administração Obama tenham melhorado as perspectivas da Wall Street de lucros recorde e bónus opulentos, os trabalhadores comuns continuam a lutar para manter os seus empregos e manter o seu padrão de vida. Dados recntes mostram que a dívida familiar que disparou durante os anos de boom está a ser reduzida a um ritmo histórico. A dívida familiar em relação ao rendimento disponível mergulhou de 136 por cento para 122 por cento em pouco de um ano, deixando muitas famílias com pouco para gastar nos centros comerciais.
O severo retrocesso provocou uma mudança para a frugalidade pessoal, a qual está a reduzir a actividade económica e a fortalecer pressões deflacionárias. O ano de 2010 provavelmente será ainda pior, pois a multiplicação de arrestos e incumprimentos imobiliários força os bancos a reduzir empréstimos drasticamente o que acelera a taxa de declínio. Isto é da Bloomberg:
“Os pedidos de arrestos nos EUA atingirão um recorde pelo segundo ano consecutivo, com 3,9 milhões de notificações enviadas a proprietários de casas em incumprimento, disse a RealtyTrac Inc. Os pedidos deste ano ultrapassarão o total de 2008 de 3,2 milhões, no momento em que o desemprego recorde e a erosão dos preços sacode o mercado habitacional…
Em Novembro os pedidos de arrestos excederam os 300 mil pelo nono mês consecutivo, disse hoje a RealtyTrac Inc. Um mercado de trabalho fraco e crédito duro são “adversidades formidáveis” para a economia, disse o presidente do Federal Reserve, Ben S. Bernanke, num discurso a 7 de Dezembro em Washington. Os 7,2 milhões de empregos perdidos desde a recessão principiada em Dezembro de 2007 são o máximo de qualquer recessão económica do pós-guerra, mostram dados do Departamento do Trabalho. O desemprego, a 10 por cento no mês passado, não atingirá o pico até o primeiro trimestre, disse Quigley”. (Bloomberg)
Os estímulos de US$787 mil milhões da administração Obama empurraram o PIB para um território positivo pela primeira vez em mais de um ano, mas o impacto máximo já foi sentido. O presidente Obama – por orientação dos seus conselheiros chefes – comutou a sua preocupação central do desemprego crescente para os défices a longo prazo. Os estímulos adicionais não serão de mais de US$200 mil milhões, dos quais uns meros US$50 mil milhões irão para iniciativas de emprego. Ao mesmo tempo, o presidente do Fed Ben Bernanke terminará o programa de facilidade quantitativa (quantitative easing, QE) o qual mantém baixas as taxas de juro a longo prazo enquanto proporciona financiamento para o mercado habitacional. Quando o programa acabar, as taxas subirão, os preços das habitações afundarão e a liquidez será drenada do sistema. A finalidade da QE com estímulos a definharem assegura que a economia deslizará outra vez para a recessão no 2º ou 3º trimestre de 2010.
Decisores políticos decidiram criar condições que são favoráveis à consolidação do sector financeiro e a privatização ulterior de activos públicos. A economia está a ser estrangulada intencionalmente.
Eis como o economista Mark Thoma explica porque o consumo não retornará aos níveis anteriores à crise:
“No futuro imediato e provavelmente durante muito mais tempo, espera-se o arrefecimento do crescimento do consumo. Um caminho que poderia alterar isso é se o governo implementasse um programa de empregos com êxito ou utilizasse alguns outros meios para aumentar o rendimento familiar (ex.: um corte fiscal nas folhas de pagamentos), e as famílias gastassem ao invés de poupar o rendimento extra…, mas o ambiente político torna um programa de emprego ou nova acção de política fiscal altamente improvável.
Analogamente … o Fed está ansioso por relaxar a sua intervenção política maciça, não por estendê-la, de modo que é improvável que a política monetária ajude muito nesse sentido. Uma vez que as autoridades de política monetária e fiscal estão relutantes em proporcionar mais ajuda, o crescimento lento é o melhor resultado que podemos obter”. (“Will Consumption Growth Return to Its Pre-Recession Level?” Mark Thoma, moneywatch.com)
Juntamente com a sinalização do consumo, os economistas Antonio Fatas e Ilian Mihov mostram porque tanto o investimento como o emprego não recuperarão do modo que esperam muitos analistas. Ao rastrear a taxa de recuperação das últimas cinco recessões, os dois economistas mostram que a procura permanecerá baixa durante um período de tempo prolongado, precipitando uma recuperação “sem empregos” e “sem investimentos”. A sua investigação defende estímulo adicional para reduzir o fosso da produção e empregar a força de trabalho em actividade produtiva. As políticas da administração são exactamente a oposta da maioria dos economistas profissionais, os quais acreditam que os défices precisam aumentar devido à super-capacidade e sub-utilização. Obama está deliberadamente a pilotar a economia para uma recessão dupla (double-dip recession).
Enquanto as instituições financeiras têm sido escoradas com taxas zero, miríades de facilidades de empréstimos e grandes carregamentos de liquidez do Fed, a economia real continua num caminho declinante. À medida que as famílias reequilibram as contas e aumentam as poupanças, os sinais de aflição tornam-se mais aparentes. Na Europa, o BCE e o FMI começaram a utilizar a crise financeira para arrebatar o controle dos orçamentos de países praguejados com défices a fim de aplicar medidas de austeridades favoráveis aos negócios. O colapso económico – que foi gerado pelo comércio super-alavancado dos bancos de papéis de investimento duvidosos – está agora a ser utilizado para afirmar o controle corporativo/bancário sobre países soberanos. A Grécia, Irlanda, Islândia, Ucrânia, Letónia, Lituânia, Portugal e Espanha estão todos actualmente no centro da reestruturação neoliberal. Com certeza, as mesmas políticas serão aplicadas dentro dos Estados Unidos sob a orientação do economista supply-side e conselheiro chefe do presidente, Lawrence Summers. Portanto, em 2010 continuará a contracção para forçar governos estaduais e locais a despedirem mais milhões de trabalhadores enquanto activos e serviços públicos são disponibilizados a preços de saldo para a indústria privada.
A deflação da dívida e o desalavancamento continuarão em 2011, enquanto arrestos, bancarrotas pessoas e incumprimentos continuarão a subir. A frustração do público com políticas governamentais ineficazes provavelmente mudará do pessimismo para a fúria de um momento para outro. A perspectiva de inquietação social ou de incidentes esporádicos de violência já não pode ser excluída.
15/Dezembro/2009
O original encontra-se em http://globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=16569
Traduzido por Resistir.